A RAIZ RELIGIOSA AMERÍNDIA

Médium paramentado de Caboclo de Penas

O ENCANTAMENTO

No processo de "evangelhização" imposto aos indígenas brasileiros pelos Jesuítas, a figura do Messias Civilizador Yurupari, não foi transformada em decalque do "Cristo", mas sim aproximada ao "Diabo" dos Católicos, embora os Jesuítas tenham adotado pessoalmente a sua erva sagrada "Petun" [Tabaco], o qual era usado para provocar transe mediúnico nos Xamãs indígenas [Payés], transformando o uso dessa "erva sagrada" em um vício profano que, ao longo do tempo, tornou-se uma praga social universal.
        Do mesmo modo, os colonos brancos assimilaram as soluções indígenas que, na prática, provavam ser eficientes nesta nova terra : trocaram o trigo pela mandioca, o leito pela rede, o vinho pelo cauim; aprenderam a fumar e começaram a gostar dos frutos e das filhas desta terra, iniciando a primeira miscigenação racial deste país, gerando filhos mestiços que foram muito apreciados como elos de ligação das alianças com as tribos indígenas, alianças estas que os colonos precisavam estabelecer para sobreviver aos ataques das tribos de nações indígenas inimigas.


( Vou ler depois )

        Começava aí o sincretismo cultural, racial e social que marcaria todo o período do descobrimento, conquista e colonização do Brasil e que, talvez, o diferencie de todos os outros povos irmãos da América Latina.
        Já o sincretismo religioso ficou por conta dos descendentes dos indígenas espoliados à medida que viam naufragar a cultura de seus ancestrais e nada lhes era dado em troca para substituí-la.
        Assim, sempre que afrouxados o laço e a peia da "evangelização" católica forçada, a espiritualidade indígena reaflorou e perdurou por um largo período de tempo, quiçá até nossa era, embora desde então já se apresentasse sincretizada com motivos cristãos, por necessidade de sobrevivência e ascensão social.
        Sobre este afloramento "impertinente" de uma religiosidade indígena que os catequistas católicos pensaram haver suplantado, assim se expressou Roger Bastide : –"Se excluir a região do Maranhão, onde o (negro) Daomeano dominou, todo o Norte do Brasil, da Amazônia às fronteiras de Pernambuco será domínio do índio. Foi ele que marcou, com profunda influência, a religião popular: "Pajelança" no Pará e Amazônia; "Encantamento" no Piauí; "Catimbó" nas demais regiões."–
        Podemos acrescentar que o mesmo se deu, inicialmente, por toda a parte, como por exemplo no Estado de São Paulo, onde brancos, indígenas e seus mestiços tiveram estreita convivência e miscigenação, ao ponto da língua Tupi aí predominar sobre a Portuguesa, até os meados do século XVIII.
      Da confusa mixagem de conceitos religiosos expressos no "Tuyabaé-Cuaá", no Catolicismo da Contra-Reforma, na "Santidade" e na "Pagelança", mal compreendidos todos de parte à parte, originou-se o "Encantamento", o culto dos "Caboclos Encantados", considerados por seus fiéis como espíritos de mestiços indígenas-brancos mais ou menos cristianizados e que faziam externamente as vezes dos "Santos" católicos, mas que ainda cumpriam uma função social para a coletividade mestiça indígena, adotando a divisão tribal em clãs - os "Filhos do Sol" e os "Filhos da Lua" - e que embora ainda usasse a fumaça da erva sagrada "Petun" [Tabaco] para induzir o transe mediúnico, o fazia através de Cangüeras [grandes "charutos" de tabaco enroçados à mão], todas estas práticas religiosas sendo acompanhadas por "pontos" ou "cânticos", melodias indígenas deturpadas e expressadas em língua portuguesa estropiada.
      Da fusão destes novos cultos de Caboclos Encantados com os primeiros aportes isolados da religiosidade dos negros Bantos, quase sempre escravos fugitivos que encontraram guarida na Pajelança e no culto dos Encantados, foi que esboçou-se o segundo sincretismo religioso brasileiro - o Culto do Catimbó.

Mana, Benção, Mandinga e Axé
Mestre Piron

 

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