A RAIZ RELIGIOSA AMERÍNDIA

Médium paramentado de Caboclo de Couro

O CATIMBÓ

        Em continuidade no tempo, foi da fusão destes novos cultos de Caboclos Encantados com os primeiros aportes isolados da religiosidade dos negros Bantus, quase sempre escravos fugitivos que encontraram guarida e proteção na Pajelança e no culto dos Encantados, que esboçou-se o Culto do Catimbó, mas no qual, agora, as cerimônias perdiam o sentido de função social da coletividade para transformarem-se em cultos individuais de satisfação de necessidades pessoais quer de índios, negros ou mestiços, ainda que de natureza espiritual, curativa ou de ligação com os antepassados de todas as etnias.
        Exemplificando a mudança de tais funções, ouça-se o triste depoimento de um velho Pajé, de nome Tarcuáa, que assim se lamentou com um pesquisador : –"Hoje não há mais Pajés; somos todos Curandeiros"– (Roger Bastide, "apud" Câmara Cascudo, em "Novos Estudos sobre o Catimbó", Brasiliensis, pg. 89).


( Vou ler depois )

        Usando uma mitologia e ritualismo bem empobrecidos, os "altares" do Catimbó representam a perda de valores iniciáticos dos indígenas brasileiros, que passam a ser substituídos pela miscigenação religiosa e apresentam, lado a lado, estampas e estátuas de santos católicos, charutos, aguardente, pequenos arcos e flechas, flautas e chocalhos indígenas, além de ervas e animais secos, objetos que são portadores dos poderes da força mística indígena "Mana", da "Benção" Católica e da "Mandinga" Banto, pois que o "Àsé" Sudanês ainda não havia aportado no Brasil.
      Mas, embora tenham abandonado o pó de tabaco insuflado diretamente nas narinas para obtenção do transe místico, ainda existia a lembrança de seu uso ancestral como "erva sagrada", através dos "charutões" e da "Princesa": nos altares do Catimbó estava a "Princesa", uma cuia de cobre ou vasilhame raso de barro, a qual sempre repousava sobre um "rolo de fumo", o qual era cercado por um pano branco que nunca tinha sido e nem nunca seria usado para outra finalidade, como a atestar sua pureza e santidade.
      O conjunto denominado por "Princesa" constituía-se na ligação com o passado indígena, pois era nela que era moída e infusa a raiz da árvore "Jurema", uma bebida levemente alucinógena que então induzia a descida dos "espíritos" invocados para provocar o transe mediúnico, ainda chamado de "Estado de Santidade".
      Os negros bantos-congoleses aceitaram esta nova concepção religiosa, sobretudo, em termos de "culto aos mortos", pois os Pajés e os Catimbozeiros, através dos Maracás e das Cunhãs, dos Encantados, do Petun e da Jurema, quiçá agora também da "Diamba" introduzida pelos africanos, comunicavam-se com o "Além", ou seja, o lugar místico e/ou mítico em que os brancos, os índios, os negros e os mestiços de todos, igualmente situavam a existência de seus antepassados.
      Desta adaptação do negro fugitivo ao novo meio ambiente, até por ser a única opção, nasceram, de acordo com a maior ou menor negritude de seus participantes, as variações de cultos miscigenados indígenas-cristãos-africanos, tais como o "Toré", o "Tambor de Minas", o "Babassuê" e o "Batuque".
      Entretanto, era o Catimbó já prenunciava a futura "Umbanda", apresentando-se dividido em "Sete Reinos Espirituais" : "Vajucá", "Tigre", "Canindé", "Urubá", "Juremal", "Josafá" e "Fundo do Mar".
      E, note-se bem: seus principais Espíritos-Chefes são indigenas brasileiros : "Itapuã", "Xaramundy", "Muçurana", "Iracema", "Turuatã", as "Moças d'água" ou "Yaras" e somente muito mais tarde, aparecem alguns "espíritos" isolados de "catimbozeiros" de descendência africana: "Pai Joaquim", etc...

Mana, Benção, Mandinga e Axé
Mestre Piron

 

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